Como eu terminei em um jantar à luz de velas com um taxista cearense
Eu estava em Fortaleza a trabalho. Minha missão era conhecer o máximo possível da cidade. Sou jornalista e precisava escrever sobre ela depois. Tudo isso em um dia. Chamei um táxi para me levar até a Praia do Futuro. Eu pedi para me deixar no lugar de maior agito da praia. A resposta dele, no entanto, me deixou um pouco preocupado.
- Vai ficar andando a pé sozinho por lá? É perigoso, ainda mais com mochila. Vão ver que é turista e você pode ser uma isca fácil.
Ele está de sacanagem comigo, eu pensei. Esse motorista só quer meu dinheiro, tenho certeza. Quer que eu fique com ele andando para lá e para cá, sendo que eu posso fazer tudo a pé, sozinho.
Eu tinha dois compromissos na Praia do Futuro: visitar dois novos hotéis em construção. Três, se considerar que eu também precisava almoçar em uma das barracas (juro que era por causa do trabalho).
Quando chegamos, dei o braço a torcer. Era uma quinta-feira à tarde de novembro e o calçadão da Praia do Futuro estava deserto. Não tinha uma alma perambulando por ali. Na parte da praia e das barracas até tinha gente, mas um movimento não interfere no outro.
Ficar andando sozinho poderia ser um pouco arriscado, realmente. Meu próximo destino era o centro histórico de Fortaleza. Negociei um preço camarada, combinei com ele um horário e fui para meus compromissos nos hotéis. Na hora marcada, Elano, o taxista, chegou.
Com seus traços tipicamente cearenses, Elano era um sujeito simples, de voz baixa e que falava somente o essencial. Serviu-me como um precioso guia. Ele me tirou todas as dúvidas sobre Fortaleza. E com o tempo passou a se interessar também sobre o que diabos eu fazia ali, anotando tudo o que via pelo caminho.
- Você escreve para um jornal? Está sempre viajando? Como é uma redação? Deve ser corrido ser jornalista, né?
Desço no centro histórico de Fortaleza e combino com ele na Praia de Iracema, em duas horas. “Óh, mas vai por ali que é mais seguro”. “Está vendo esses manequins sendo carregados? É que hoje tem feirinha da madrugada”. Ah, esse Elano era ponta firme! Muito do que sei de Fortaleza devo a ele.
Como todo bom amigo, ele também aprontava das suas. Prometeu-me levar no melhor restaurante da Praia de Iracema, e por um preço camarada. Esse Elano estava maluco! Mesmo eu conseguindo o reembolso do valor pelo jornal, não dava para comer ali. Meus chefes iam me matar. E eu ainda tinha outros dois restaurantes para visitar.
Fui descobrir depois que a cada cliente que ele leva lá ganha um prato de comida. Malandro demais esse Elano. Foi mal cortar sua janta na faixa, mas eu sou jornalista e sou pobre - e o jornal também. Só pareço rico andando de táxi para lá e para cá.
Próxima parada, Colosso Lake Lounge, um beach club à beira de um dos lagos mais bonitos de Fortaleza, o Lago Colosso. A estrada é um breu só para chegar.
- Tem taxista que não sabe chegar aqui não. Só quem conhece bem Fortaleza.
De fato, não havia a menor sinalização. Elano me explica que é um lugar frequentado por playboys de Fortaleza. A decoração é toda de madeira, repleta de samambaias penduradas em estruturas moldadas. E o jantar é sempre à luz de vela.
Convido Elano para ir comigo. Ia ser muito deprimentente ficar nesse ambiente sozinho, com grupos de amigos jovens tirando selfies em seus smartphones, de um lado, e declarações de casais apaixonados, de outro. Melhor ir com meu amigo Elano.
- Eu sou um cara de sorte na vida, sabia?
Elano, não me assusta! Eu te trouxe aqui, mas não vou te pedir em casamento, não, cara.
- A minha mulher ganhou um sorteio nacional do Bradesco. A gente ganhou uma casa, que na época valia uns 120 mil reais. Nós a vendemos. Eu comprei esse meu táxi aqui, e ela terminou de construir nossa casa. Não somos ricos, mas não passamos aperto.
E foi ouvindo essas histórias sobre a vida dele, sobre Fortaleza, sobre o estado do Ceará, sobre a vida de taxistas, que a noite terminou. E é esse tipo de situação, como terminar em um jantar à luz de velas com um taxista cearense, que a gente guarda de lembrança de qualquer viagem, seja a trabalho, seja a lazer.
Abraços, Elano, foi um prazer.
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