O que posso ensinar para quem quer escrever um livro de viagens


  São Paulo, Roma, Jerusalém, Ibiza  5392 visualizações

"Steh, quero escrever um livro. Me ajuda?!". Desde quando lancei meu livro, GiraMundo, essa é uma das frases que mais escuto. A continuação da conversa é mais variada, mas geralmente permeia pelos caminhos de como começar a escrita, maneiras de publicação ou detalhes técnicos. Já quero adiantar que não sou nenhum George Martin ou Yuval Harari, mas minha obra foi muito bem avaliada e vira e mexe está entre os dez mais do dia em duas categorias da Amazon. Sendo assim, acho que posso dar um conselho ou outro que será útil caso você queria começar a escrever.

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Meu livro é sobre a viagem que fiz em 2015 e mudou minha vida. Estava puto com tudo, liguei o foda-se e comprei uma passagem só de ida para Roma, onde deixei meu dinheiro e passado para trás e parti pegando carona rumo a Jerusalém em busca de Deus (na sentido mais amplo possível) e de mim mesmo. No caminho encontrei paixões na Estrada, quase morri algumas vezes e fui realmente iluminado. Depois acabei indo morar em Ibiza onde curti a vida adoidado em um estilo muito mais hardcore que o icônico Ferris Bueller. Essa história e as histórias que fazem parte dela me ensinaram muita coisa. Ensinamentos que tentei passar no meu livro. E esse é o primeiro conselho que te dou caso você queira escrever. Como assim? Qual conselho? Esse aqui, ó: passe ensinamentos! Desde a Idade da Pedra contamos histórias para lições serem passadas para frente. Para que a roda não tenha que ser inventada de novo e para que ninguém morra comendo o que não deve. Então, antes de escrever a primeira letra maiúscula no topo de uma página em branco, pense nos ensinamentos que você quer passar adiante.

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Tudo certo até aqui? Pensou no que você quer ensinar para sua audiência? Beleza, pode começar a escrever... só que não. Para o livro ser bom mesmo, antes de você começá-lo, tem que pensar em uma pergunta que será respondida no final da escrita. E você não pode saber a resposta. Pode ter hípoteses, mas a resposta será uma jornada de autodescobrimento sua. Tipo: "Será que servem cerveja no inferno?"; ou "Androides sonham com ovelhas elétricas?" (dois títulos de livros reais, que dão ótimas perguntas a serem respondidas/descobertas de diferentes formas no final do processo). Escolha bem sua pergunta, porque não dá para mudar depois. Ou até dá, mas sua obra corre o grande risco de ficar uma coisa esquizofrenica.

Para qualquer história ser contada, existem cinco elementos básicos de Storytelling a serem considerados: Personagens (com quem sua audiência estabelecerá uma relação emocional), Templo/Local (onde e quando se passa sua história), Estilo (o jeito de conduzir seu público pela narrativa), Enredo (como os elementos se relacionam) e Tema (sobre o que se trata sua história). Abordo cada um desses cinco elementos de forma lúdica e profunda no seguinte link, caso você tenha curiosidade. Esse é meu último ponto para você considerar antes de começar a escrever. Agora pronto, está liberado, vamos começar.

O começo de qualquer coisa dá medo e escrever um livro não é diferente. Por isso uma página em branco intimida muito. Então, como começar o "começo" da história? Bom, o começo da sua narrativa tem sempre que dizer sobre o que ela se trata. O ideal é que nos primeiros parágrafos o leitor já descubra sobre o que você está falando. Deixe isso claro para ele. Saber disso já é um grande avanço para começar o "começo". Daí para frente tudo fica mais fácil.

O caminhar do seu livro pode seguir diferentes formatos. Desde "A Jornada do Herói" de Joseph Campbell até o modelo Pixar de criação de conteúdo. Vai de você. Mas seja qual for o formato, dê picos de excitação para sua audiência ao construir o "recheio" em meio ao andar da carruagem. Existem três pontos de conteúdo que nossos cérebros nos obrigam a prestar atenção: situações de quase morte, conteúdo sexual e momentos empáticos. Cada um desses pontos está ligado à evolução da nossa espécie e ao nosso passado ao redor das fogueiras. Seja por necessidade de sobrevivência, reprodução ou simplesmente pela nossa humanidade em si, aprendemos a prestar atenção à histórias com esses atributos. Então pense em colocá-los como linhas de batimentos cardíacos entre momentos cotidianos da narrativa para manter seu público interessado e ao mesmo tempo não sobrecarregá-lo de acontecimentos.

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O último toque que dou a respeito de construção de conteúdo é uma opinião pessoal minha. Quando entrevistei Walcyr Carrasco na Rota da Tocha Olímpica descobri o motivo do sucesso das suas obras: ele transcreve a própria essência. E eu tentei fazer a mesma coisa com meu livro, o que deu muito certo. Esse detalhe é bem ilustrado logo no começo desse texto. Eu falo palavrão, sou agressivo, brincalhão, desbocado e adoro figuras de linguagem que envolvem a cultura pop. Foi muito mais fácil e natural escrever meu livro do jeito que eu falo e sou do que mascarando a mim mesmo por trás de algum outro tom de voz menos polêmico. Mas aí vai de você o jeito que quer transcrever sua história e se expor.

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Começo e miolo prontos, agora só falta o final. E o final é simples. Basta responder aquela pergunta que você elaborou antes mesmo de colocar a primeira letra maiúscula no topo da primeira página em branco. Depois disso é só se despedir da audiência de uma forma condizente com a trajetória da narrativa. Fim. Fim?! Não, espera aí, tem muito mais coisa.

Depois do conteúdo pronto você pode buscar uma editora ou virar um autor independente, como foi meu caso. Escolhi esse caminho simplesmente por não querer ficar preso a nenhum contrato e ter total poder de decisão sobre meu livro. Confesso que fui muito feliz com minha escolha, diferente de amigos que conheci que se foderam na mão de editoras incompetentes ou mal intencionadas ou incompetentes e mal intencionadas.

O bom de optar por uma editora é que você já tem tudo organizado e não precisa se preocupar com "nada". Já como autor independente você precisará encontrar e dirigir seu capista (quem faça sua capa), seu revisor, seu diagramador e tirar os documentos necessários. Você será seu próprio editor e chefe. Então se dedique. E não pense que qualquer um desses serviços é dispensável. Economize na cachaça do final de semana, mas não na produção do seu livro. Muita gente julga um livro pela capa, então procure um designer/diretor de arte com portfólio similar ao que você deseja para chamar a atenção do seu público. Revisor é extremamente necessário para que nenhum erro de português escape ou algumas passagens da história não fiquem confusas para seus leitores. Diagramador nem preciso falar, né?! É desconfortável ler alguma coisa que parece que foi feita no Word de qualquer jeito e sem espaçamento correto. Todos esses serviços você consegue achar em sites especializados ou simplesmente pela recomendação de amigos via redes sociais. O mesmo pode ser dito das medidas de capa (como lombada, orelha e faces) e miolo (contando com dobra e sangria ideais para diagramação). O que eu mais penei para descobrir foi o tipo de papel para ser utilizado. Fiz uma pesquisa para ver o melhor custo benefício e cheguei no Supremo Alto Alvura 250 gramas para capa e Pólen Soft 80 gramas para o miolo.

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Recomendo fazer todo esse processo de edição depois de tirar os documentos requisitados para proteger seus direitos autorais e para a comercialização do seu livro. São eles o ISBN(http://www.isbn.bn.br) e a Ficha Catalográfica (http://cbl.org.br/servicos/ficha-catalografica). O código de barras do ISBN geralmente é colocado na contracapa do livro enquanto a Ficha Catalográfica entra na folha de rosto. Tanto seu capista quanto seu diagramador vão te agradecer se você já tiver ambos em mãos. E tem mais uma coisinha que vale a pena ser feita antes do processo de edição: mandar o material para alguns leitores beta.

Minha história inteira era muito clara para mim. Mas quando escrevi algumas partes, passei uma impressão ruim que pude perceber por causa dos meus leitores beta. Mandei o manuscrito do meu livro para 10 amigos antes de publicá-lo e registrei críticas e observações recorrentes que indicavam a necessidade de mudanças ou melhorias. Fez toda a diferença no resultado final da obra.

Bom, livro escrito e produzido. O trabalho acabou? Não! Falta a divulgação. O que eu fiz foi escrever artigos gratuitos para diferentes portais contando sobre minhas aventuras e loucuras, participei de lives com influenciadores digitais de viagem e dei palestras pocket para diferentes públicos. Daí para frente, a coisa viralizou e espero que ela também viralize para você.

Se você chegou até aqui, deve ter percebido uma coisa: escrever um livro dá trabalho. E cansa, ah, como cansa! Mas também é uma coisa extremamente gratificante. Quando vejo que estou no topo do ranking da Amazon ou recebo alguma mensagem de um leitor, fico extremamente feliz e orgulhoso. Como se fosse um rockstar e escutasse minha música tocando na rádio. Ou fosse jogador de futebol e me visse na televisão fazendo um golaço. A moral dessa história toda de ser escritor é a seguinte: escrever um livro dá trabalho, ansiedade e estresse, mas vale totalmente a pena!

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